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Publicado em 11/12/2013

Desembaraço de bens leva o dobro da média mundial

Na Bahia, no Porto de Aratu, um dos mais movimentados do Estado, os cerca de 600 navios que transportaram cargas no ano passado esperaram em média quatro dias para realizar suas operações. Nos portos mais competitivos do mundo, a espera é de algumas horas. Para executar uma operação de navegação de cabotagem dentro do Brasil, é necessário assinar 44 documentos para movimentar uma carga. A burocracia é um dos principais entraves para os importadores e exportadores brasileiros que usam frequentemente os portos, sendo um dos fatores que fazem o desembaraço de um bem nacional levar em média pouco mais de cinco dias para ser realizado, o dobro da média mundial.
Pesquisa recente do Instituto de Logística e Supply Chain (Ilos) feita com 189 profissionais de logística de 157 das mil maiores empresas em faturamento no Brasil apontou que 61% deles indicaram as exigências burocráticas como o principal problema existente hoje no setor portuário.
O segundo e terceiro problemas apontados foram: capacidade saturada (53% dos consultados) e acesso rodoviário (51%). “A burocracia é um grande entrave, há um mar de papéis e uma sobreposição de entes, o que leva a uma grande ineficiência. Ainda mais com a gestão dos portos não sendo profissionalizada e muitos desses órgãos que fiscalizam alimentos ou medicamentos e precisam dar seus pareceres não trabalham 24 horas por dia. Para piorar: muitas vezes há greves em um dos setores”, destaca o diretor do Ilos, Paulo Fleury.
Segundo o estudo do Ilos, divulgado neste segundo semestre, o custo da burocracia no Brasil fica mais evidente em uma comparação com os Estados Unidos, país com características territoriais similares à brasileira. Se o custo da preparação dos documentos para exportação no Brasil fosse similar ao americano, os exportadores economizariam US$ 95 por contêiner exportado. Isso significa que, em um ano, sobrariam nos cofres das empresas brasileiras US$ 170 milhões, caso o Brasil seguisse o padrão dos Estados Unidos. Já, se a análise englobar apenas a diferença de custo entre Brasil e Estados Unidos no despacho aduaneiro, a economia seria de US$ 340 por contêiner, o que significaria US$ 610 milhões no ano. Assim, a economia total passaria a US$ 780 milhões.
Os custos da ineficiência não se limitam apenas a esses gastos diretos com procedimentos burocráticos.
Durante o período em que as empresas precisam levantar papéis, incorrem custos referentes à perda de oportunidade em fazer novos negócios. Caso o Brasil conseguisse reduzir esse tempo de burocracia de nove para três dias, como é nos Estados Unidos, evitaria um gasto de aproximadamente US$ 191 milhões, que é o custo de oportunidade relativo a seis dias de capital empatado.
Esse valor foi calculado apenas em relação à movimentação de contêineres para exportação, podendo ser ainda maior caso envolva outras atividades. “O Brasil tem um tempo de desembaraço mais do que o dobro da média internacional, o porto é um organismo que reúne vários entes, sendo que um pequeno atraso ou uma greve em um dos elos provoca efeito cascata.”
“Há um cipoal de leis, decretos e portarias que aumentam a burocracia e tornam conturbado o ambiente regulatório”, ressalta o presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), Willem Manteli. Segundo um estudo, desde a Constituição de 1988, já foram publicadas 4,7 milhões de normas no Brasil. “Isso cria insegurança jurídica”, disse.
O setor terá um grande desafio ao longo dos próximos anos: a movimentação de cargas, hoje em cerca de 900 milhões de toneladas por ano, deverá superar 2 bilhões de toneladas até 2030.
Para o diretor executivo da Associação de Usuários dos Portos da Bahia, Paulo Villa, seria essencial pensar em um comando único nos portos. Hoje, dependendo da carga movimentada, uma empresa precisa de autorização de vários agentes anuentes, como Marinha, Autoridade Portuária, Anvisa, Ministério da Agricultura, Receita Federal.
“Poderia se pensar em um comando único da União para facilitar a vida das empresas, se o governo está implementando um porto sem papel, precisaria haver um único ponto de referência”, comenta. Outra medida necessária seria a ampliação de capacidade do sistema portuário brasileiro, com destaque para o aumento da área destinada aos contêineres. “Os portos devem ser usados para movimentar cargas e as armazenar provisoriamente, mas o que vemos aqui são áreas crescentes destinadas ao armazenamento, o que acaba contribuindo para a burocracia”, destaca.
Um dos pontos em que o governo federal está trabalhando para melhorar a competitividade é o horário de funcionamento. A maioria deles não opera 24 horas, sendo essa uma das principais queixas dos empresários. Dentro da estrutura portuária, convivem 23 poderes anuentes que participam do trâmite de uma mercadoria, como Autoridade Portuária, Receita Federal, Ministério da Agricultura, Marinha e Anvisa.
“O problema de operar 24 horas não é das Companhias Docas, mas depende de acordo com cada um dos órgãos anuentes existentes na estrutura portuária. Estamos em processo de negociação com cada um deles para que possamos ter funcionários de cada um desses poderes 24 horas, em cada um dos portos”, afirmou o assessor especial da Secretaria Especial de Portos (SE), José Newton Barbosa Gama.
A estrutura arcaica do sistema é outro obstáculo. As Companhias Docas, empresas de propriedade da União, que administram 18 portos no país, não têm gestão profissionalizada. Hoje os dirigentes são indicados por governadores, prefeitos, deputados, senadores. Não existem metas de desempenho para esses profissionais.
A maioria dessas companhias possui passivos bilionários adquiridos ao longo dos últimos anos e nunca sanados. Em alguns momentos, sentenças judiciais sequestram receita dessas companhias para que débitos sejam pagos, reduzindo a margem de manobra dessas empresas e dificultando ainda mais os investimentos feitos por elas.
Uma das ideias que empresários têm sugerido ao governo seria a transformação das companhias docas em Sociedades de Propósito Específico (SPE), em que a União poderia ter participação minoritária, mas o comando delas estaria sob controle da iniciativa privada.
Outro fator que contribui para a combinação burocracia e ineficiência é a exigência de contratação de mão de obra pelo Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo), controlado pelos estivadores. A nova Lei dos Portos encerrou essa interpretação, permitindo que os operadores portuários possam contratar funcionários registrados com base na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Mas as empresas que buscam atuar no novo regime trabalhista têm enfrentado resistência dos trabalhadores.
Um caso recente é do Embraport, em Santos, que teve de se comprometer a usar a bordo dos navios 50% de mão de obra vinculada (CLT) e 50% de trabalhadores avulsos até junho de 2014. “Esse órgão gestor às vezes não tem eficiência e treinamento para oferecer serviços, se tornando mais um obstáculo à competitividade e à redução da burocracia”, diz Fleury.

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